Quando
Osmar chegou a Estação de Ferraz de Vasconcelos estava um verdadeiro caos. Era
sábado e ele entendeu o porquê de imediato, pois no dia anterior recebeu a
notícia da CPTM que iriam mexer em alguma coisa nas Estações de Poá e Calmon
Viana. Não era novidade esse detalhe, porque os trens nunca funcionavam
normalmente nos dias de semana. Quem diria aos fins de semana. Esse tipo de
transtorno levava os usuários ao limite do estresse, pois muitos discutiam uns
com os outros ou brigavam por motivos bobos; ficavam inquietos, ansiosos e com
pressa, e por esse motiva havia um grande empurra-empurra. Às vezes saiam socos
e pontapés para tudo quanto era lado.
Ele procurava seus amigos da
igreja Assembleia de Deus da Via Margarida, pois haviam marcado um encontro ali, para se reunirem e irem para um retiro espiritual, numa chácara no
interior de São Paulo, pois o líder dos jovens disse ser muito bacana, e todos
concordaram. Quando os encontrou os viu sentados no chão de madeira comendo
churrasco, porque era uma Estação provisória já que a CPTM, o governo ou fosse
quem fosse, estava construindo outra nova há meses. Percebeu de imediato: não
haviam tomado café e estavam morrendo de fome, pois o dia ainda não tinha
amanhecido. Os vendedores de espetinhos estavam lucrando. Não entendeu a razão
de ter churrasco logo de manhã, mas talvez fosse alguma festa. Um conhecido
seu, Renato, estava tomando vinho, daqueles vinhos do sul; e Osmar não se deu
ao luxo de perguntar onde Renato havia conseguido a bebida, só disse.
– Logo de manhã?
Todo mundo estava animado e a algazarra era grande. Havia
chovido, e mesmo o chão estando úmido não os impediu de se assentarem no nele
para festejar o encontro. Os trens estavam demorando passar. De repente Plínio
viu uma moça passar com um vestido florido minúsculo e comentou com o pessoal.
– Logo de manhã e a periguete acha que está bonita com
aquele vestido minúsculo e os culotes aparecendo.
Fizeram alguns comentários pejorativos por causa disso. Outros
preferiram fazer graça, cada qual com o seu julgamento pessoal. E no meio do
bulício, Osmar ouviu alguém dizer num to alto.
– Sua gorda.
Não demorou muito tempo um rapaz baixinho, que se
apresentou como Antônio, ele parecia ser nordestino por causa do sotaque, perguntou
todo metido a valente, gesticulando e apontando o queixo, como se quisesse que
alguém lhe desse um sopapo.
– Quem mexeu com a minha mulher?
Fábio, um dos jovens tentou conversar com Antônio, dizendo
que não foram eles os zombadores. Ele inferiorizou o rapagão de dezessete.
Então, João, o líder dos jovens, foi conversar com o rapaz enfurecido, pois o
havia escutado dizer que Fábio era um moleque.
– Está vendo a minha mulher? – Antônio disse para João. – O
que tem se ela é gorda ou não? Vocês que são da igreja deveriam se envergonhar
por ficar mexendo com a mulher dos outros.
Osmar não entendeu direito; porque a mulher que o garoto
havia dito que o vestido estava curto demais era outra e a mulher de Antônio
era uma negra bonita de calicalom e que não demonstraria estar à cima do peso
se não fosse jaqueta. Ele achou estranho que o homem tivesse vindo reclamar.
– Mas ninguém mexeu com a sua mulher. Osmar disse ainda
sentado.
– Você tem quantos anos? Antônio perguntou, porque viu que
todos naquela roda de jovens ainda não era homem formado.
Osmar estava separado algum tempo, não estava bem
emocionalmente e por isso quis ir ao retiro espiritual com os jovens. Julgava
ser propício estar com pessoas com bom astral, devido a situação em que se
encontrava. Então, levantou-se oferecendo a mão para Antônio. Não estava
nervoso e tinha uma paciência de Jó, coisa que a separação fizera com ele.
– O meu amigo tudo bom? Ninguém mexeu com a sua mulher.
– Quantos anos você tem? Antônio quis saber sem ao menos
deixá-lo concluir e disse em seguida. – Eu tenho 35 e não sou moleque.
– Eu tenho 33.
Antônio era mais baixo que Osmar. Quando olhou em seus
olhos sérios, mas complacentes, demonstrou mais respeito, pediu desculpas e já
ia se retirando. Os jovens estavam satisfeitos com o desfecho inesperado. “O
sujeito de 33 anos que nem anda com a gente é o cara”, pensaram por causa dos
olhares respeitosos que davam. Quando Renato chegou com o vinho barato e um
pedaço de carne assada na mão, perguntou o que havia acontecido. Os jovens
foram falando aos atropelos, porque o Antônio já estava saindo da Estação, por
um lugar que os construtores não previram que alguém passaria.
– O que tá pegando? Perguntou.
Antônio reconheceu a voz de imediato. Voltou todo marrento,
empurrando o peito de Renato e dizendo “foi você, né seu vacilão?”, enquanto
Renato pedia calma e para que ele não encostasse a mão nele. Do lado de fora, a
mulher de Antônio implorava para que o marido deixasse aquele assunto para lá.
– Esse vacilão mexe com a mulher dos outros e acha que está
certo? Tentou explicar a sua ação violenta.
Renato não fazia parte do grupo. Estava ali, porque iria
para a casa de um amigo, onde haveria mais churrasco e mais bebida. Não que ele
fosse flor que cheirasse, mas com um pouco de vinho na mente, com um revolver
calibre 32 na cintura e um sujeito empurrando seu peito e o fazendo ser menor
do que uma formiga. Ah, isso ele não poderia tolerar de jeito nenhum. Sacou o
revolver e deu uns três tecos no peito de Antônio, que morreu no local.
10/11/2013 6h51
Já escreveu melhor meu caro, não que essa não esteja boa...
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