quinta-feira, 13 de fevereiro de 2014

Ébrios de Amor

Lembrar do dia, da comemoração não faz sentido nenhum nesta madrugada cálida deste verão com este copo que seguro. Ainda mais porque a concentração fica pouca quando se mistura o cansaço, calor e pernilongos azucrinando no ouvido enquanto o álcool alucina mais a mente. O que sei é que havia uma comemoração. Rolava um monte de estilo de música desde rock a forró. Um amigo - o pai dele tinha um bar - resolveu fazer uma caipirinha com carambola. Da turma, pelo que sei, ninguém havia tomado a bendita. O que sei é que todos gostaram. E ao som do forró os cearenses e paulistanos dançavam. Eu nunca fui um bom dançarino. Ainda mais de forró. Talvez eu faça parte da grande massa masculina que fica olhando a pouca massa pegando as mulheres nos salões só pelo fato de saber dançar bem. E o que isso importa no momento? Nada! Porque a festinha era familiar: dois irmãos de criação do meu amor; suas respectivas mulheres; o amigo que fazia a caipirinha; a namorada dele e mais algumas pessoas que a essa altura do campeonato não me lembro.

E vai uma caipirinha pra cá, outra pra lá, outra praculá... Quando se deu conta, minha ex-mulher estava bêbada. Percebeu que não podia parar de dançar, porque se parasse iria vomitar ali mesmo. Eu achei tudo muito engraçado (e ela não dançava comigo, dançada com o meu amigo que fez a caipirinha).

- Eu não posso parar de dançar, porque senão vomito. Disse, quando o moço resolveu descansar um pouco.

O irmão mais velho dela ria, porque a embriaguez era visível. Sua irmã, que ainda não foi citada, também ria assim como todos os outros.

- Eu tô falano sério, gente! Sua voz era arrastada e, por ser arrastada se tornava mais engraçada. Ria por tudo. Parecia uma maconheira de primeira viagem. - Se eu parar vou vomitar. Venha dançar comigo. Chamava qualquer um.

Eu? Ora, eu... Eu estava feliz por vê-la feliz daquela maneira. A brisa ainda não tinha me pegado de jeito e eu não iria deixá-la me pegar sabendo que a minha mulher precisava de ajuda para voltar para a nossa casa. O nosso filho estava com a avo, minha sogra e ela não precisavam de mais trabalho com dois adultos bêbados num fim de semana qualquer.Quando saímos da festa, ela vinha falando alto, eu a segurando pelo braço, enquanto a deixava apoiar em meu ombro para não cair e se esborrachar no chão. Era tudo muito hilário para mim.

- Você precisa tomar um banho para ver se melhora. Eu disse.

- Eu vou vomitar. Esta frase estava em sua mente, talvez fosse a ânsia que estava sentindo que lhe fazia pensar só nisso.

Eu ria, porque realmente achava aquilo engraçado. É diferente de quando a pessoa é alcoólatra e você tem que conviver com a embriaguez dela todos os dias. Uma pessoa que bebe para se divertir, geralmente, não procura motivos para brigar. Briga quem é magoado, nervoso ou procura se esconder de algum problema. Ela não, ela estava se divertindo.

- Vou lhe dar um banho quando a gente chegar em casa.

- Promete que cuida de mim? A voz embargada e doce, típica de mulher sedutora pidona. Talvez não seja tão difícil imaginar uma ébria sedutora pidona.

Quando chegamos em casa, ela foi para o quarto e tirou a roupa. Eu a ajudei, pois seus sentidos estavam bem debilitados. Depois entrei com ela no toalete. Estava calor, eu tinha suado e também estava precisando de um banho. Não poderia deixar minha mulher sozinha naquelas condições: água, chão liso e pessoa ébria é um convite para um acidente.

Eu via aqueles seios lindos em minha frente, a cintura de pilão mesmo após ter tido um filho, o cabelo liso vermelho... Sem malícia. Via com ternura, enquanto ela apontava o dedo no meu nariz, sem encostá-lo nele e dizia:


- Posso te falar uma coisa, Cá? Posso?

- Pode. Disse com a maior naturalidade que encontrei, enquanto ela me olhava molemente, porém com olhar brando, doce, ledo e terno.

- Não é porque eu tô bêbada e que você tá cuidando de mim... - Era estranho ela começar a falar de sentimentos (porque eu previa) naquele momento, sendo que tivemos tantas oportunidades em outros dias. Mas eu estava ali para cuidar dela, para ouvi-la e não iria atrapalhar. Afinal, era de minha ajuda que ela precisava.- Não é porque eu tô bêbada - continuou - mas eu te amo, sabia? - Ela escorregou, eu a segurei e ela se apoiou na parede. - Não é porque tô bêbada... - sentia a necessidade de repetir a mesma coisa.- Eu sei; eu sei...


Quantos anos fazem isso? Não sei. Perdi as contas. O que sei é que não me lembro de ter ouvido-a dizer tais palavras novamente. E quando estou com saudade e entro no toalete para me banhar não tem como não recordar: os cabelos vermelhos que ficavam no ralo e por todo o canto da casa (agora não existem mais); os momentos bons que tivemos embaixo deste teto... Procuro um canto que não tenha estado com ela, mas a casa não é tão grande assim pelo tempo que estivemos juntos.

Saudade... Já tentei defini-la como poeta, cronista e contador de história, mas não cheguei a nenhuma conclusão. Só sei que o buraco que tem em meu coração é maior do que eu mesmo consigo imaginar.

- Não é porque tô bêbado que estou contando esta história, que eu tô dizendo que...

3 comentários:

  1. Uauuu...Adorei essa declaração de amor em forma de história...lindooo

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  2. Adorei. Teve um leve toque de crônica mas em seguida caiu como conto bem contado. Gostei muito.

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  3. A inspiração transcendo pelos dedos !!
    Parabéns nobre rapaz .

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